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Quem, em três milênios não é capaz de “se dar conta”, vive na ignorância e na sombra à mercê dos dias e o do tempo”! J. W.GOETHE”.
Ao passear num imenso jardim, certa vez deparei-me com uma sebe que me impressionou pelo volume dos emaranhados dos galhos tanto quanto pela passagem, quase secreta, que se faziam os arranjos da natureza. Atraída por essa sebe desejei ultrapassa-la como que curiosa, desejando ver o que estaria do outro lado, quando com muitos arranhões e dificuldades encontrei entre a passagem um jeito de me adentrar, descobri que lá dentro, onde todos os ramos decidiram cruzar-se, havia um oco, que me permitia ficar em pé, via todos que por ali passavam, sem que algum deles pudessem me ver ou mesmo imaginar-me. Não posso descrever a sensação que me acompanhou naquele instante, era um misto de curiosidade, conforto, sossego, e até uma certa artimanha que usaria mais tarde para me esconder quando me sentisse ameaçada. Desde então, guardei aquele canto do jardim como o meu predileto, nunca levei alguém até lá, ao contrário, era meu canto de silencio e solidão que usava, sempre que queria do mundo me afastar. Ali pensava, conversava com meus próprios pensamentos, admirava os personagens que por ali passavam e por vezes, chamava a atenção de alguém sem que este me pudesse ver, pois jamais alguém imaginaria aquele lugar usado por alguma criança travessa. O caminho entre essa sebe não era fácil, frequentemente me arranhava e quase sempre meus pais tinham que cuidar de um ferimento ou outro, mas o prazer de estar ali era sempre muito maior e a tranquilidade que ali sentia era por certo o início do meu amadurecimento que mais tarde viria experienciar. Hoje, quando o mundo toma conta da maior parte das minhas vivências, levo-me em recordações àqueles momentos. Não encontro mais os emaranhados que me feriam, salvo as experiências que vivencio o que por vezes, se tornam como aqueles arranjos espinhosos, mas estar entre a sebe, ainda que de forma imaginável, é sem dúvida um conforto e uma alusão que me prende a atenção aos acontecimentos externos da vida e me colocam sempre no centro de mim e de minhas próprias experiências. Estar entre a sebe é poder ver o mundo que se movimenta diante dos nossos olhos, sem, contudo participar dele, ainda que por pequenos momentos. Estar entre a sebe é escolher um lugar de prazer dentro de nós. Estar entre a sebe é ainda uma oportunidade de calar as vozes externas de um mundo cultural e excêntrico, para poder ouvir o mundo dos nossos próprios pensamentos verbalizando emoções e identificando posturas. Estar entre a sebe nos ensina a observar sem concluir. Alimenta-nos a percepção e nos induz ao cuidado. Estar entre a sebe é o mesmo que viver numa dimensão superior e mais sublime do que os afazeres do cotidiano, é se calar quando não se tem palavras, é sorrir quando alguém de nós se aproxima ainda que este não nos possa observar, é viver um momento isolado para que possamos experimentar nossas próprias emoções sem a interferência ou a inferência de outros, é saber decidir, é saber escolher, é saber parar, é saber se ver e se dar conta
Dedicatória:
Dedicado aos: leitores do site
Publicado em 12/03/2004 18:03:03 – 2.210 leituras

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